28/10/11

novembro - histórias recebidas



Insegura, a velhota entrou na livraria.
Corpos de palavras…mistérios…
Tacteou as lombadas expostas como se, com o contacto, pudesse decidir a escolha.
- Quero... um livro. Para a minha neta…anda na primeira classe…
A empregada mostrou-lhe um livro azul. Na capa tinha uma ave que levava no dorso uma criança sorridente.
Naquela noite a história foi balbuciada pelos lábios infantis.
A criança fez-se mulher, mas jamais esquecerá aquela história que maravilhou os olhos verdes da sua avó.
Eugénia Edviges Parracho


 Quando era pequena a minha mãe dizia: - Querida, escuta o mar...
 E eu tentava escutá-lo dentro da conchinha que a avó me dera. Mas era tão difícil, só conseguia escutar a voz da avó que parecia estar falando. Contava-me histórias, cozinhava para mim, e eu, não percebia o que o mar tinha a ver.
 Olho para a minha mãe e vejo-a a chorar, e disse-me:
-Todos os dias a tua avó ia buscar o peixe, até partir...
Insegura, a velhota entrou na livraria. 
Olá, o meu nome é Geisa Lopes e tenho 12 anos, moro em Beja. Aqui tenho uma mini-história, espero que seja agradável de ler!

 
Porque os crescidos também tropeçam, um dia tropecei na saudade, e dei um valente tombo, a caixinha onde guardava as recordações caiu, espalhando pela calçada nomes, retratos, emoções, músicas, cheiros, sabores, risos,  palavras,  abracinhos e  afetos.
Levantei-me, sequei as lágrimas com a manga da camisola e resolvi começar a arrumar todas as recordações uma a uma muito bem arrumadinhas com cuidado para não deixar ficar nenhuma para trás. Tudo voltou para dentro da caixinha até um dia…
Ana Paula Marques, Odivelas

Damos as boas vindas ao Inverno….Dizemos um até já ao Verão…Dizemos um olá à chuva!
Suspiramos por um raio de sol. A flor é escondida por suaves flocos de neve que a acariciam suavemente. A árvore despe-se numa doce timidez.
Chegam os serões aquecidos por um chocolate quente. Aguardamos por um gelado numa esplanada!
O Natal espreita num sopro de vento. A praia retira-se para um descanso.
Tudo numa harmonia inexplicavelmente saudável que nos aconchega a alma!
Ana Cristina dos Santos Gomes, 29 anos, Amadora

O dia por vezes pode ser assustador. Correm à minha volta sem olharem
uns para os outros, sem se preocuparem uns com os outros. A pressão
dos testes, o tentar responder a todas expectativas, principalmente às
minhas. No fim do dia, no colo da minha mãe encontro a paz que tanto
procuro, que tanto anseio. Ouço o seu coração, sinto a sua pele quente
o cheiro tão próprio dela. Finalmente paz num dia que parecia não
terminar.
Sónia Areia, 37 anos Estoril

Sou mãe. Trabalho numa associação que apoia sobreviventes de Traumatizados Crânio-Encefálicos e seus pais. Pais que a cada dia têm à prova o seu amor incondicional pelo filho que em coma lutou pela vida, foi dado como perdido e viveu, previsto inválido e hoje fala, anda e pensa. Se não fosse tão amado e um pouco chorado, não alcançava este milagre. Maravilham-me estas mães. Que desde o dia do trauma, serão para sempre, mães de um sobrevivente.
Vera Bonvalot, 41 anos, Estoril
 

05/10/11

outubro 2011 - pais e filhos


Ficou a olhar para os livros novos, os cadernos, o estojo sem manchas de tinta. Havia outra coisa nova: não sentia nenhuma excitação por voltar à escola. Mexeu nos livros, remexeu-se por dentro, mexeu-se na cadeira.
– Então? – O silêncio remexeu o pai. – Deixa-me contar-te um segredo…
Com os livros como testemunhas, falaram da escola, das ilusões e das aprendizagens, de crescer. Falaram muito.
Antes de dormir, sorriu. Uma excitação invadia-o por dentro, antecipava a nova fase. Adormeceu.
(texto: Margarida Fonseca Santos; ilustração: Francisca Torres) 

03/10/11

outubro 2011 - pais


Fora difícil, mas a ideia era excelente.
Pôs a mesa, acendeu as velas, espiou o jantar e o gelado de amoras. Eram duas tigelas – uma para eles, outra para os filhos. Afinal, tinham apanhado as amoras em conjunto, entre risos e peripécias, e feito o gelado a seis mãos.
A mulher entrou. Viu-a estranhar o silêncio, estranhar as velas, estranhar o sorriso. Envolvendo-a num abraço carinhoso, explicou:
– Os miúdos ficaram com a avó. Hoje somos só nós.
(texto: Margarida Fonseca Santos; ilustração: Francisca Torres) 

02/10/11

outubro 2011 - filhos

– Brincámos imenso com caricas… – explicou a Mariana.
Recebeu um sorriso de troça, não gostou.
– Pega-se num sapato e faz-se uma pista. Depois damos piparotes à vez. Ganha quem chegar primeiro à meta.
Mais sorrisos trocistas... Resolveu tirar do bolso três caricas velhas e fez com o pé uma pista na areia do parque. As amigas ajoelharam-se, desconfiadas… e experimentaram.
Não fosse chamarem-nas, ainda lá estariam. A Mariana não ganhou a corrida, mas ganhou muito mais que isso!
(texto: Margarida Fonseca Santos; ilustração: Francisca Torres)