Há alguns anos atrás, visitando Roma, saboreei a melhor pizza até hoje, inigualável.
Também lembro-me de ter presenciado, em momento de tédio na janela da hospedaria, um majestoso pôr-do-sol.
Da companhia, das pessoas que conheci, não sinto saudades, posto que da vida só guardamos o que fez bem ao paladar e aos olhos, trouxe amor...
Sei que ocasos, em qualquer lugar que estejamos, são sempre uma magnífica maneira de fugir da realidade e correr para o belo.
Bia Hain, Brasil
31/08/12
Óculos/soluço
Fiz tudo como tinha planeado. Combinei encontrar-me com ele numa esplanada, para que, sem levantar suspeitas, pudesse usar os óculos de sol. Era o ideal para disfarçar as olheiras deixadas por tantas lágrimas. Cheguei, cumprimentei-o e mostrei-me entusiasmada com esta nova etapa da vida dele. Desejei-lhe muita sorte. Não queria que a minha última impressão deixada nele fosse de sofrimento. “Consegui!” – pensei. Mas depois, no momento exacto do adeus, o soluço encoberto durante toda aquela hora... desarmou-me!
Vera Viegas
Aroma/amora
– Interrompi o teu deleite – começou ele, rindo-se assim que o puxei mais para perto, de modo a poder sentir o aroma delicioso da amora silvestre.
Com esmero e precisão colhi um fruto do meio das silvas e coloquei-lho entre os lábios. Ele recebeu-o com a avidez de quem raramente tem ocasião para apreciar os sabores do campo.
Depois ficámos ali abraçados, só sentindo o perfume com que a natureza nos presenteava e esquecendo a hora do regresso.
Quita Miguel
Com esmero e precisão colhi um fruto do meio das silvas e coloquei-lho entre os lábios. Ele recebeu-o com a avidez de quem raramente tem ocasião para apreciar os sabores do campo.
Depois ficámos ali abraçados, só sentindo o perfume com que a natureza nos presenteava e esquecendo a hora do regresso.
Quita Miguel
Mais uma vez: Socorram/Marrocos
Achou estranho os cheiros que deslizavam sob aquele céu tão azul. Era agradável, assim como o colorido das roupas e a sonoridade no andar das pessoas. Agradável e desconhecido. Que lugar era aquele?
- Marrocos – alguém gritou.
Os sentidos lhe faltaram, desmaiou.
- Socorram, socorram!
Voltou a si e começou a gritar:
- Marrocos não, Marrocos não... Eu sou do Maranhão.
Aeroporto, conexão, voo atrasado, deu tudo errado.
- Já que estou cá, ao menos uma volta de camelo vou dar!
Ana Paula Amaral do Carmo, Brasil
Publicado aqui:
http://ladodeforadocoracao.blogspot.com.br/2012/08/desafio-77-palavras.html
- Marrocos – alguém gritou.
Os sentidos lhe faltaram, desmaiou.
- Socorram, socorram!
Voltou a si e começou a gritar:
- Marrocos não, Marrocos não... Eu sou do Maranhão.
Aeroporto, conexão, voo atrasado, deu tudo errado.
- Já que estou cá, ao menos uma volta de camelo vou dar!
Ana Paula Amaral do Carmo, Brasil
Publicado aqui:
http://ladodeforadocoracao.blogspot.com.br/2012/08/desafio-77-palavras.html
Socorram/Marrocos
Socorram! – alguém gritou. Pensei em perigo; por terras estranhas pensamos que há uma ameaça em cada esquina, como se a selva se abrisse assim que abandonássemos o nosso bairro.
Não me enganei: vi uma mulher a ser arrastada para um carro. Armei-me em herói – a cobardia também fica guardada no nosso bairro – e corri até ela. Olhei para o corpulento raptor e começou-me a passar a heroicidade.
Corta! Tirem-me esse anormal de cena – disse o realizador, naquela tarde quente em Marrocos.
Bau Pires
Não me enganei: vi uma mulher a ser arrastada para um carro. Armei-me em herói – a cobardia também fica guardada no nosso bairro – e corri até ela. Olhei para o corpulento raptor e começou-me a passar a heroicidade.
Corta! Tirem-me esse anormal de cena – disse o realizador, naquela tarde quente em Marrocos.
Bau Pires
Sopa/após + assim/missa
Pedrinho estava ansioso naquele dia. Vovó tinha preparado uma deliciosa sobremesa. Porém, não seria fácil para ele saboreá-la. Ele detestava verduras.
- Quem não comer a sopa de verduras não tem direito ao doce.
- Snif, snif, choramingava o netinho.
- Só após a sopa ! Podem chorar até em grego!
Assim, Pedrinho acabou com a “missa” de ladainha e choradeiras e comeu. Terminou logo! A vovó pergunta:
- Queres mais?
Ele quase cai da cadeira de susto!
Chica, Brasil
Publicado aqui: http://chicabrincadepoesia.blogspot.com.br/2012/08/o-susto.html
- Quem não comer a sopa de verduras não tem direito ao doce.
- Snif, snif, choramingava o netinho.
- Só após a sopa ! Podem chorar até em grego!
Assim, Pedrinho acabou com a “missa” de ladainha e choradeiras e comeu. Terminou logo! A vovó pergunta:
- Queres mais?
Ele quase cai da cadeira de susto!
Chica, Brasil
Publicado aqui: http://chicabrincadepoesia.blogspot.com.br/2012/08/o-susto.html
30/08/12
desafio nº 17
O desafio nº 17 vai dar uma trabalheira… uma trabalheira
muito divertida!
Então, como será?
Procurem duas palavras simétricas (e que existam!):
Por exemplo:
- Medi – Idem
- Servil – Livres
- Socas – Sacos
- Saco – Ocas
- Lava – Aval
Vai ser de certeza uma…
… história em 77 palavras!
(pode usar as do exemplo, claro, mas vai ser engraçado
descobrir mais…)
Deixo-lhe aqui a
minha:
Queria dar-lhe o aval
que me pedira, mas nunca cheguei a fazê-lo.
Era uma criatura sinuosa, de palavras moles e sentidos
escondidos, olhos onde nunca transparecia a alma. Chamavam-lhe tantos nomes
diferentes que nunca cheguei a saber o verdadeiro.
Passaram-se três meses e três dias sobre o pedido e a minha
inacção. Sei que assim foi, ela mesmo mo lembrou. Senti o golpe na nuca e ouvi
dizer:
– Lava-me
esta casa! A partir de hoje, é minha.
Margarida
Fonseca Santos
EXEMPLOS
Ouvir este ou outros textos aqui - Diário 77 ― 92 ― A partir de hoje
EXEMPLOS
Ouvir este ou outros textos aqui - Diário 77 ― 92 ― A partir de hoje
EXEMPLOS - desafio nº 17
Pedrinho estava ansioso naquele dia. Vovó tinha preparado uma
deliciosa sobremesa. Porém, não seria fácil para ele saboreá-la. Ele detestava
verduras.
- Quem não comer a sopa de verduras não tem direito ao doce.
- Snif, snif, choramingava o netinho.
- Só após a sopa! Podem chorar até em grego!
Assim, Pedrinho acabou com a “missa” de ladainha e choradeiras e comeu. Terminou logo! A vovó pergunta:
- Queres mais?
Ele quase cai da cadeira de susto!
Chica, Brasil
- Quem não comer a sopa de verduras não tem direito ao doce.
- Snif, snif, choramingava o netinho.
- Só após a sopa! Podem chorar até em grego!
Assim, Pedrinho acabou com a “missa” de ladainha e choradeiras e comeu. Terminou logo! A vovó pergunta:
- Queres mais?
Ele quase cai da cadeira de susto!
Chica, Brasil
Socorram! – alguém gritou.
Pensei em perigo; por terras estranhas pensamos que há uma ameaça em cada
esquina, como se a selva se abrisse assim que abandonássemos o nosso bairro.
Não me enganei: vi uma mulher a ser arrastada para um carro. Armei-me em herói – a cobardia também fica guardada no nosso bairro – e corri até ela. Olhei para o corpulento raptor e começou-me a passar a heroicidade.
Corta! Tirem-me esse anormal de cena – disse o realizador, naquela tarde quente em Marrocos.
Bau Pires
Não me enganei: vi uma mulher a ser arrastada para um carro. Armei-me em herói – a cobardia também fica guardada no nosso bairro – e corri até ela. Olhei para o corpulento raptor e começou-me a passar a heroicidade.
Corta! Tirem-me esse anormal de cena – disse o realizador, naquela tarde quente em Marrocos.
Bau Pires
Achou estranho os cheiros que deslizavam sob aquele céu tão
azul. Era agradável, assim como o colorido das roupas e a sonoridade no andar
das pessoas. Agradável e desconhecido. Que lugar era aquele?
- Marrocos – alguém gritou.
Os sentidos lhe faltaram, desmaiou.
- Socorram, socorram!
Voltou a si e começou a gritar:
- Marrocos não, Marrocos não... Eu sou do Maranhão.
Aeroporto, conexão, voo atrasado, deu tudo errado.
- Já que estou cá, ao menos uma volta de camelo vou dar!
Ana Paula Amaral do Carmo, Brasil
- Marrocos – alguém gritou.
Os sentidos lhe faltaram, desmaiou.
- Socorram, socorram!
Voltou a si e começou a gritar:
- Marrocos não, Marrocos não... Eu sou do Maranhão.
Aeroporto, conexão, voo atrasado, deu tudo errado.
- Já que estou cá, ao menos uma volta de camelo vou dar!
Ana Paula Amaral do Carmo, Brasil
– Interrompi o teu deleite – começou ele, rindo-se assim que
o puxei mais para perto, de modo a poder sentir o aroma delicioso da amora silvestre.
Com esmero e precisão colhi um fruto do meio das silvas e coloquei-lho entre os lábios. Ele recebeu-o com a avidez de quem raramente tem ocasião para apreciar os sabores do campo.
Depois ficámos ali abraçados, só sentindo o perfume com que a natureza nos presenteava e esquecendo a hora do regresso.
Quita Miguel
Com esmero e precisão colhi um fruto do meio das silvas e coloquei-lho entre os lábios. Ele recebeu-o com a avidez de quem raramente tem ocasião para apreciar os sabores do campo.
Depois ficámos ali abraçados, só sentindo o perfume com que a natureza nos presenteava e esquecendo a hora do regresso.
Quita Miguel
Fiz tudo como tinha planeado. Combinei encontrar-me com ele
numa esplanada, para que, sem levantar suspeitas, pudesse usar os óculos de sol. Era o ideal para disfarçar
as olheiras deixadas por tantas lágrimas. Cheguei, cumprimentei-o e mostrei-me
entusiasmada com esta nova etapa da vida dele. Desejei-lhe muita sorte. Não
queria que a minha última impressão deixada nele fosse de sofrimento. “Consegui!”
– pensei. Mas depois, no momento exacto do adeus, o soluço encoberto durante toda aquela
hora... desarmou-me!
Vera Viegas
Vera Viegas
Há alguns anos atrás, visitando Roma, saboreei a melhor pizza até hoje, inigualável.
Também lembro-me de ter presenciado, em momento de tédio na janela da hospedaria, um majestoso pôr-do-sol.
Da companhia, das pessoas que conheci, não sinto saudades, posto que da vida só guardamos o que fez bem ao paladar e aos olhos, trouxe amor...
Sei que ocasos, em qualquer lugar que estejamos, são sempre uma magnífica maneira de fugir da realidade e correr para o belo.
Bia Hain, Brasil
Também lembro-me de ter presenciado, em momento de tédio na janela da hospedaria, um majestoso pôr-do-sol.
Da companhia, das pessoas que conheci, não sinto saudades, posto que da vida só guardamos o que fez bem ao paladar e aos olhos, trouxe amor...
Sei que ocasos, em qualquer lugar que estejamos, são sempre uma magnífica maneira de fugir da realidade e correr para o belo.
Bia Hain, Brasil
Em noite de lua azul, o Raul saiu para ir ver o luar. E como
brilhava a lua azul de agosto, tanto a gosto do Raul. É segunda lua de agosto e
por isso lhe chamam azul. O Raul fica sempre encantado pelo luar e deixa-se ficar: fica a ouvir os
gatos que miam em cima dos muros, as bruxas de chapéu pontiagudo, que passam a
cavalo nas suas vassouras voadoras e transportam sonhos de outros mundos.
Margarida Belchior
Margarida Belchior
No planeta dele tudo era intensamente colorido. Diferente. As
árvores, as plantas, os animais, uma miríade de cores impossível. Dei por mim
de nariz no ar, perseguindo um aroma
conhecido que me recordou de tardes quentes de Verão. Foi então que as vi, negras
e inchadas pelo calor. "Amoras!", gritei eu entusiasmada. Ele, porque
já tinha aprendido, sorriu com a boca e os olhos. Colhi uma amora e comi-a. E contei-lhe tudo sobre
os bichinhos da seda.
Alexandra Rafael
Alexandra Rafael
Da janela entreaberta, desprendia-se um aroma irresistível. Pedro e Afonso
largaram a bola e aproximaram-se, sorrateiros, do quintal da vizinha. Mal os
pressentiu, o anafado gato amarelo bufou e esgueirou-se para cima de uma
árvore.
Parados debaixo do parapeito, puseram-se à escuta, até se certificarem de que não havia ninguém na casa. Pedro ajoelhou-se, Afonso subiu e lançou a mão à bela tarte de amora. De repente, sentiu que alguém o puxava para dentro. Tinha sido apanhado!
Carlos Alberto Silva
Parados debaixo do parapeito, puseram-se à escuta, até se certificarem de que não havia ninguém na casa. Pedro ajoelhou-se, Afonso subiu e lançou a mão à bela tarte de amora. De repente, sentiu que alguém o puxava para dentro. Tinha sido apanhado!
Carlos Alberto Silva
Ora, ora, quem diria
Acontecer algo de tão raro
Benício orar todo santo dia
À Deus pedindo amparo
Ele que era tão descrente
Só vivia de noitadas e orgia
Limparam sua conta corrente
Ficou numa doida agonia
Perdeu seu rico solar
Mal tinha onde dormir
Agora vivia na rua a capengar
E pelos ralos a cair
A duras penas descobriu
O que é viver de penitência
Só chora, nunca mais sorriu
Teve que lutar pela sua sobrevivência
Majoli Oliveira, Brasil
Acontecer algo de tão raro
Benício orar todo santo dia
À Deus pedindo amparo
Ele que era tão descrente
Só vivia de noitadas e orgia
Limparam sua conta corrente
Ficou numa doida agonia
Perdeu seu rico solar
Mal tinha onde dormir
Agora vivia na rua a capengar
E pelos ralos a cair
A duras penas descobriu
O que é viver de penitência
Só chora, nunca mais sorriu
Teve que lutar pela sua sobrevivência
Majoli Oliveira, Brasil
Estava escrito nas estrelas que seria para toda a vida.
Nasceram em locais opostos do mundo mas foi em Roma que se encontraram e passaram parte do verão. Viram-se, apresentaram-se e… o amor surgiu como avalanche incontrolável.
A lua vestia o seu mais brilhante vestido quando ele lhe colocou o anel no dedo e lhe perguntou:
- Queres ouvir comigo a mesma canção até ao fim das nossas vidas, Lena?
Estava escrito nas estrelas mas eles não sabiam.
Ana Paula Oliveira
Nasceram em locais opostos do mundo mas foi em Roma que se encontraram e passaram parte do verão. Viram-se, apresentaram-se e… o amor surgiu como avalanche incontrolável.
A lua vestia o seu mais brilhante vestido quando ele lhe colocou o anel no dedo e lhe perguntou:
- Queres ouvir comigo a mesma canção até ao fim das nossas vidas, Lena?
Estava escrito nas estrelas mas eles não sabiam.
Ana Paula Oliveira
Lena é uma jovem alegre e desinibida que adora roupas coloridas. O
seu riso contagiante faz com que todos a estimem. Sabem que Lena perdeu o pai
num acidente trágico e que, por isso, a mãe sofre de uma constante depressão. E
que é a coragem, a alegria e o amor da filha que a mantêm viva…
No entanto, em segredo, Lena afaga o pequeno anel que o pai lhe deu e chora amargamente a sua ausência.
Carlos Alberto Silva
No entanto, em segredo, Lena afaga o pequeno anel que o pai lhe deu e chora amargamente a sua ausência.
Carlos Alberto Silva
Naquela aldeia que agora está cada vez mais longe do mundo,
cheia de recordações, tempo houve em que a sua juventude era em grande número.
Ao Domingo era impensável não assistir ao serviço religioso na igreja, isto
para as raparigas, porque eles facilmente se descartavam da pressão das mães.
Porém, não se pense que andavam longe; quando acabava a função aí estavam eles
à nossa espera, no santo sacrifício da saída da missa, pois era assim
lhe chamavam.
Maria C. Bruno
Maria C. Bruno
Por muito que olhasse para aquele bouquet, não conseguia ver nada mais
que uma rama sem graça. Só havia uma razão para que todas as
noivas insistissem em aparecer com um molho de brócolos: não sabiam o que fazer
às mãos.
Donzília barafustava pelo ridículo
daquele grupo de donzelas, de braços no ar, esgatanhando-se para agarrar as
flores que voavam através da sala.
– Dizes isso porque não sabes o
que é amar.
E com isto a calaram.
Quita Miguel
a mulher queria desposar deus.
deus não dorme, disse, não escarra nem
dá puns.
nem te espeta e marca golo,
respondeu-lhe o homem.
ela encolheu os ombros e voltou a ligar.
linha interrompida, lamentou-se.
que nervos, logo agora
que já não usava maquilhagem, por ter ouvido dizer que deus preferia caras
limpas...
deixa-te de megalomanias, vociferou o
homem.
e agarrou-a pela cintura.
ela sentiu os joelhos tremer, revirou os
olhos, poisou o telefone e trancou a porta.
Rita Bertrand, 40 anos, Lisboa
Deteve-a a foto sorridente na montra e
as unhas confiantes exibidas. Verniz tom de amora.
Comprou o produto miraculoso convicta
dos seus poderes especiais.
Podia jurar sentir, de antemão, os
efeitos pretendidos. Era um ligeiro endireitar de ombros, um sorriso desdenhoso
nos lábios.
Sentou-se, majestosamente, dando início
a um novo ritual. Pintou, uma a uma, as unhas esguias. Deixou-as secar,
pousadas, na saia colorida.
Fez a mala, fechou a porta, silenciosa.
Na rua, havia aroma a
liberdade.
Lena Pacheco, Funchal, 31 anos
Lena Pacheco, Funchal, 31 anos
Domingo triste. A
chuva espreitava por entre os vitrais da igreja cobrindo-os de pequenas gotas,
pérolas vindas de longe, há muito esperadas.
Eva ajoelhou-se e, depois de rezar a primeira
Ave-maria, parou de acariciar o
rosário. Era demasiado religiosa para ter dúvidas mas, naquele momento, tudo
estava em causa. A reviravolta na sua vida e a enorme raiva que sentia
provocaram demasiados conflitos interiores e vacilaram a sua fé.
Agarrada à
aliança, chorou e não mais rezou.
Ana Paula Oliveira, S. João da
Madeira, 51 anos
Quem ama a vida ama tudo o que dela pode tirar.
João não conseguiu ultrapassar o desgosto de perder o amor da
sua vida e agora passa o tempo no vazio dos encontros fortuitos de uma noite
bem regada e bem (mal) passada. Quem ama a vida não a desperdiça em
pequenos-almoços com estranhos. Maria tem esperança que o João consiga dar a
volta, mas acha que ele não ama a vida desde aquele dia em Roma.
Mariana Santo, Lisboa,
25 anos
O VESTIDO
A Mafalda
estava radiante com o vestido novo que a costureira estava a fazer-lhe para o
banquete em comemoração do seu décimo aniversário. Mas quando ele chegou, ficou
triste pois o vestido não vinha como ela queria. A saia grande
e rodada estava larga demais e o pior, é que não havia tempo para arranjar
antes da festa. Por sorte, as aias do palácio vieram em
seu socorro e a Mafalda foi a mais linda do festejo!
+
A LUA
Todos
queriam que o Raul fosse médico, advogado ou até futebolista,
já que ele parecia ter tanto talento para a bola. Mas o que ele gostava mesmo
era de à noite deitar-se ao luar e admirar a Lua vezes sem
conta. Estivesse nova, cheia, a crescer ou a minguar para ele brilhava ao seu
olhar, tanto como as estrelas que a acompanhavam. E um dia, quando crescesse,
iria ser astronauta para poder viajar até ela e voltar.
Vanda Pinheiro
Suavemente, a
brisa arranhava a rama das árvores. O sol despedia-se do verão em
estertor lânguido, mas sofrido. Já se sentia, no ar, a proximidade de um outono
quente, calmo. O céu azul carregado de pedaços brancos de algodão, anunciava
que haveria mudança.
"White",
o belo gato de olhos azuis, espreitava inquieto.
Algo se passava.
Por entre a verdura do jardim surgiu uma gata cinzenta e amarela. Lustrosa,
atraente!
"White" estava
preparadíssimo para amar.
Dorinda Oliveira, 72 anos, Arrifana, Santa Maria da
Feira
Ingénua, pensara ter encontrado o amor num homem mais velho.
Inconscientemente atribuíra-lhe a característica de protector. Almejava
segurança.
Enganara-se! Anos de sofrimento
e desilusão reforçaram o sentimento de solidão. Resolvera fugir.
Para Roma. Recomeçar!
Valia a pena sonhar num futuro melhor.
Encontrava-se ferida, mas com esperança.
O sentido para a sua vida era o amor. A
proposta de trabalho, em Roma, que
aceitara, óptimo pretexto para sair do país; voltar a sorrir. Voltar a amar?!
Sem enganos!
Isabel Pinto
Amizades
Não se
considerava uma pessoa servil, antes
prestativa. Sem se intrometer na vida dos demais.
Havia sempre
alguém a precisar de algo, principalmente idosos solitários e fazia-o com todo
o gosto.
Assim
conhecera o Sr. Felisberto, tem 77 anos e muitas histórias a contar!
Costumava ir
ler para ele e acabavam horas na conversa. Sentiam-se livres ali, sob a acácia, aproveitando os últimos raios de sol
que passavam entre as folhas, apreciando a
companhia um do outro.
Carla Silva, 40 anos, Barbacena,
Elvas
Vida
regenerada
Ah! Um
romance em Roma... Lena, nunca
imaginou viver algo assim. Omar a
surpreendeu com as passagens, o anel de
brilhante, um ramo de
rosas vermelhas e a promessa de um lindo, eterno amor!
Aturara tantas
humilhações pela vida, que vivia como um animal acuado, por vezes cortante como lâmina afiada.
Nem nos
melhores sonhos vivera algo assim. Naquela noite, tomaria um ralo mingau
de araruta e
deitaria. Descansar, arar o
coração. A vida é mesmo rara!
Roseane
Ferreira, Estado do Amapá, Macapá, Extremo Norte do Brasil
Ernesto,
o avaro, como lhe
chamavam, jazia quase solitário na capela. De poucas palavras, nunca fizera
amigos na aldeia. Apenas Maria se afeiçoara aos seus desencantos e conhecia o
que tantos outros nunca adivinharam. Herdeiro de uma fortuna, Ernesto vivia
recatadamente, afrontando a ignorante população. Lentamente, a capela foi
ficando pequena para tantos jovens. Cada um, em silêncio, orava perante os restos mortais. Nesse dia,
todos conheceram uma parte dos jovens que Ernesto ajudava há tantos
anos.
Amélia Meireles, 62 anos, Ponta Delgada
Finalmente, o dia tão esperado.
Faria dezoito anos, faria o que
queria,
sem dar satisfações. Finalmente ser dona
de si,
ninguém mandaria nela, chegaria a casa
às horas que lhe apetecia.
Tudo isto falou à irmã, sem lhe dar
hipótese
de a contrariar. A mãe, que escutara
tudo, achou que ela
foi longe demais. Esperou pela chegada do
pai delas.
Antes de dizer que ia sair,
ouviu o RALHO da mãe, debaixo do OLHAR
inquisidor do pai.
Natalina Marques, 57 anos, Palmela
Histórias de
pescadores
Assim passava a vida o tio António, pescando peixes, pescando sonhos. Além
de pescador, era poeta e contador de histórias.
De sorrisinho na boca, saía-lhe sempre uma…
Uma manhã, estávamos vários pescadores no mar, mas só o tio António é que
pescava.
– Sai sempre ao mesmo! – dizíamos na galhofa.
Então ele, de sorriso costumeiro, respondeu-nos logo:
– Sai sempre ao mesmo, pois sai…
Não se pode ter preguiça.
Antes de vir à pesca,
Vou sempre rezar à missa!
Domingos Correia, 58 anos, Amarante
O namorado da Carolina enfrenta um
problema oncológico bastante grave, os tratamentos parecem não estar a
resultar.
A namorada, amigos e familiares têm
sofrido muito... é terrível sentir a impotência e desejar ajudar, mas apenas
dispor do coração e um ombro amigo.
Então, a Carolina comprou duas passagens
de avião para Roma, pois sabe que o namorado sonha conhecer o Vaticano e o
Papa.
Ela acredita que, com fé e amor,
todos os problemas podem ser ultrapassados.
Susana Sofia Miranda Santos, 38 anos, Porto
À luz da LAMPARINA devorava
Dietas. Mas só aí. O ESTAFERMO da balança não lhe dava nenhuma Alegria. Um dia,
jogou-a pela janela abaixo.
A partir daí, foi uma
gordinha feliz. As unhas sempre cuidadosamente arranjadas, pois claro!
Margarida Freire, 75 anos, Moita
Roma
Sonhei? Sonhei!
Vivo em Roma…
auge da época romana… lindas princesas… também algumas pessoas muito cruéis.
Grandes gladiadores lutam até o adversário perder vida, para grande prazer do
povo. Imperador manda chicotear indivíduos.
Há muita avareza – só
ricos é que têm riqueza. Imperatriz usa lindos colares de ouro, joias de rara
beleza. Fazem-se grandes festas, onde belas mulheres tocam suas harpas, para
outros dançarem. Há grandes banquetes que a todos sacia. Pessoas beijam-se
loucamente com amor! Amor?
Sérgio Felício, 37 anos, Coimbra
29/08/12
Ana Paula Oliveira e o mar
Ainda faltavam quatro semanas para o nascimento mas ela impôs-se. Nasceu no mar. O marulhar das ondas foi a primeira música que ouviu e que a embalou. Por isso lhe chamaram Maria Mar. Por isso o sol foi o padrinho e a lua a madrinha. Por isso, foi abençoada pelas estrelas. Também por isso, herdou a personalidade inconstante do mar. Ora calma e sossegada, ora irascível e tempestuosa, tal como o mar, viveu livremente, cheia de mistério.
Ana Paula Oliveira
Ana Paula Oliveira
Isabel Pinto e a palavra suicídio
11 anos de idade. Tanto tempo passado. A
tentativa de suicídio, o
Hospital. O Coma.
Renasceu" ao ver o sofrimento no
rosto de sua mãe e a ajuda do seu pediatra.
Agarrou-se à culpa e à possibilidade de
uma libertação futura, através do conhecimento. Este trouxe-lhe autonomia,
mas não lhe eliminou o sofrimento, o tédio, o vazio...
Ainda hoje, quando revê o seu passado,
termina nesse tempo longínquo, onde deveria ter ficado. Não existir neste
presente.
Isabel
Pinto
28/08/12
Vanda Pinheiro foi viajar!
De manhã acordar e sair de casa
sem destino. Viajar ao
encontro de outras terras. Conhecer natureza e património. Recheada de rios,
serras e cascatas, a riqueza natural junta-se aos monumentos de arquitetura
dourada com anos de história e lendas escondidas. Um simples olhar e voltam a
ter vida como se as suas personagens nos sussurrassem ao ouvido o que há muito
esperam contar. O regresso a casa é tão compensador quanto o desejo de nova
viagem.
Maria Jorge/Maria Jorge
27/08/12
Vera Viegas, cheia de simplicidade...
Conhecem aquele tipo
de pessoas que entra numa sala o mais discretamente possível e sem qualquer
artifício cativa toda a gente?
Conhecem aquelas
flores que crescem silenciosamente no campo, e que quando encontradas são mais
apreciadas do que qualquer bouquet ornamentado e perfumado?
Conhecem aquelas
músicas compostas por um belo poema e um simples piano por trás que nos
arrepiam ao escutar?
Se responderam que
sim, Parabéns! Significa que conhecem o poder e a beleza da SIMPLICIDADE!
Vera Viegas
23/08/12
A Sandra Paulino trabalhou e bem, ora leiam!!!
Desafio da semana! - nº1 – abril 2012
Reencontro
O pôr-do-sol era fogo no horizonte, pareceu queimar o mar assim que lhe
tocou naquele instante perfeito. Deitado na areia da praia, pensava regressar
ao passado, aos momentos vividos junto da mulher que permanecia no seu coração.
Valeria a pena tentar? Agora que Montsé deixara de lhe escrever?
Agora, depois de tantos anos sem a ver? Sabia que tinha casado, tinha filhos,
tinha uma vida sem si. Feliz? Com um sorriso, sonhou com o
abraço do reencontro.
Desafio
da semana - nº 2 – abril 2012
Invisível
A minha vida não parecia ser importante
para ninguém, mas resolvi escrever a minha história num
velho caderno de capa dourada. Nascida no meio de uma família
numerosa, senti-me amiúde invisível. Contudo,ser invisível
também se revelou útil, sobretudo quando queria fazer coisas proibidas, como ir
ao sótão descobrir tesouros. Remexia em velhos baús e experimentava vestidos da
bisavó. Dançava sozinha agarrada a fotografias antigas. Quis ser
feliz e deixar para sempre a solidão que me
acompanhava.
Desafio da semana nº3 – maio 2012
Nomes Perdidos
Na fábrica da região, não existem
nomes. Existem números.
O 1 é um homem engraçado e bem disposto. Já nem ele
próprio se lembra do nome que a mãe lhe deu.
O 2 perdeu muita da alegria que o caracterizara.
A 3 é uma mulher rude.
O 4, esse, está perdido de amores pela número 8, criatura de boas maneiras.
A 5 tem muitos ciúmes da número 7.
O 6 é descontraído e tem 10 filhos gémeos
Desafio nº 4 - maio 2012
Um Bule com História
Sou um bule rachado, sou…
Durante anos, fui o principal bule da
casa e agora… Agora tenho que dar lugar aos jovens bules, acabadinhos de sair
da fábrica.
Estou velho e acabado, mas tenho muita
história dentro de mim. Fui feito pelas mãos habilidosas de um velho artesão da
Galiza. Servi muitas gerações da família Maia. Aqueci muitos corações à volta
da lareira, com chá quente de aroma acolhedor. Sou um bule com muitas histórias
para contar.
desafio nº 5 - maio 2012
El Andaluz
Filho de andaluz e de aspecto trigueiro,
filho primogénito do Ti Simón, não respeitava nada nem ninguém.
De arma em
punho, caminhava de forma pesada pela vila
andaluz, com uma evidente atitude grosseira e herege no rosto,
e desafiava
até mulheres que se atravessassem no seu caminho.
De manhã, subia as colinas de
estradas sinuosas, sempre com
aspecto agressivo, furioso. A barba por fazer e
o ar
trigueiro, despertavam em todos desejos de violência e de morte.
desafio nº 6!!!
Milú
De dia, viam-se pouco os homens que trabalhavam nas minas. Era à noite que se dirigiam ao
Bar da Mané. Gulosos, lambiam os beiços depois de sorver o líquido quente e
doce da chávena branca e bolorenta, mirando a Milú pelo canto do olho.
A jovem roliça ria-se das piadas e
parecia feliz. - São reles estas criaturas – pensava Milú –, mas são eles que
me permitem ganhar dinheiro.
Olhou para um deles e sorriu.
Quem diria…!
desafio nº 7
São 7
São 7 as
histórias que o pai lhe contava muitas vezes. Em cada um dos 7dias
da semana, esperava ansiosa. A preferida era Branca de Neve e os 7Anões.
São mesmo 7 anões, papá? Não são 8 nem 9? E como se
chamam? O pai olhava-a divertido. Diz tu, filho. Ora, deixa lá ver… 7…
Rezingão, Envergonhado e Miudinho… Feliz, Soneca e Atchim… Falta um para chegar
a 7… Ah! E Sabichão!!! 7 Anões,
concluiu.
Sandra Paulino
A Gisela Franco juntou-se a nós!
Hoje o dia na escola ia ser diferente.
No pátio as crianças sentaram-se em
filinhas e brincavam, empurravam-se, riam...
Não percebiam bem como é que aqueles
sete colegas iam apresentar um teatro.
Aqueles colegas simpáticos que lhes
devolviam sorrisos no recreio, não tinham voz!!!
Começou.
Com gestos, as mãos mostraram a lua, o
sol, o coração, o mundo... todos perceberam a estória da amizade.
As palmas juntaram-se às outras mãos
erguidas no ar e acenavam. Riam
todos.
+
Acordei
com a luz do sol que nascia. Espreguicei-me e olhei.
Não havia carros, pessoas,
fumo, sirenes nem vozes.
Apenas vi as flores que
apareciam como salpicos pequeninos de cor, por entre as minhas amigas, as árvores,
enormes, pequenas, e tantas que forravam o meu lar de verde. Um riacho
convidava a beber, Corria ao longe entre as rochas.
Ergui-me, comecei a andar.
Primeiro devagar, depois acelerei e corri feliz pela floresta.
Sou um tigre. Sou livre.
Gisela Franco
22/08/12
Teresa Silvestre, a brincar...
A minha Criança Interior
– Olá por onde tens andado?
– Por aqui, por ali, mas sempre a olhar para ti. A ver-te
crescer, amadurecer as ideias, concretizar os teus sonhos e à tua espera! Sim,
à tua espera, para voltarmos a brincar, como o fazíamos quando não tinhas
horários, quando não te esquecias de mim.
– Mas, não me esqueci de ti!
– Agora não!!! Por isso estou aqui. E agora, agora está na hora de Brincar!!! Porque está na hora de
eu voltar!!!
Teresa
Silvestre
Marco Carreira, com imaginação
Na esplanada a beber café. Aborrecido. Neste mundo urbano sem
vida, penso na minha palavra favorita e tudo muda. Dentro da chávena de café
vejo uma Galáxia em espiral num Universo desconhecido. No céu, um gigantesco Zeppelin com
gigantes rotores deslocando-se como um Titã. Ao meu lado passa um Velociraptor,
soltando um leve grunhido. A linha urbana muda drasticamente para torres de
jardins suspensos, tudo dentro de uma colossal cúpula. Sim, IMAGINAÇÃO é a minha palavra preferida.
Marco Carreira
Majoli Oliveira e um sorriso
O SORRISO DE MARCO ANTONIO
Será que existe algo mais colorido
Que um lindo sorriso a brilhar
No rosto de um filho tão querido
Que distante de nós está?
Mesmo que seja em fotografia
Emociona, faz chorar
Pois sentimos, através dela, a alegria
Do momento a vivenciar
Esse sorriso tão natural
É o cartão de visita do meu filho
Pois vive sempre em alto astral
Diante de qualquer empecilho
Em breve ele aqui estará
E em mim, um sorriso há de brilhar
Majoli
Oliveira
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