30/09/20

Rosário P. Ribeiro – desafio 221

A Zebra Maior estava cansada de ser espezinhada. As vizinhas zebras, gemiam «Aquele camião, a pingar, já nos estragou a pintura!». Mas os queixumes eram engolidos pelos milhões de sapatos, patins, bicicletas, que atravessavam. Só o Tampão se mantinha silencioso. Mas, por vezes, bufava. E quando o fazia, todos se afastavam, ligeiramente. Tinham-lhe respeito, dizia-se. Ele era um dos guardiões dos esgotos da cidade e ninguém queria que lhe saltasse a tampa. Que o hálito era pestilento!

Rosário P. Ribeiro, 62 anos, Lisboa

Desafio nº 221 – imagem da passadeira

Chica – desafio 221

Foram meses de trabalho escondido.

Escavações com ferramentas improvisadas. Fariam um túnel. 

Quase quilômetro, muito afinco, como nunca haviam demonstrado em qualquer outra situação em suas vidas. 

Se tivessem usado aquela garra para o bem, ali não estariam.

Infelizmente, intuito nada elogiável. 

Mas as autoridades policiais eram atentas, perceberam...   

Colocaram gás na boca do esgoto, por onde eles pretendiam escapar, fugindo do presídio. 

Surpresa os aguardava na   final "boca do lobo". 

Se passassem pela fumaça, as algemas...

Chica, 70 anos Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil 

Desafio nº 221 – imagem da passadeira

Publicado aqui: https://chicabrincadepoesia.blogspot.com/2020/09/valeu-pena.html

Elsa Alves – desafio 109

Suspiros e Solidão

A tia Adélia não era tia de ninguém. Mas era assim que a tratávamos. Nós, os miúdos de quem ela tomava conta. Morava sozinha , num pequeno apartamento , por cima de uma pastelaria , onde lhe chamavam menina Adélia .Religiosamente, comprava, às sextas-feiras , um pacote de suspiros ,que distribuía por nós, como prémio pelo nosso bom comportamento. Bom comportamento?!? Quando hoje a visito no lar ,cheio de velhotas como ela,  diz-me que tem muitas saudades nossas. Eu levo-lhe suspiros...

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 109 – solidão no meio de gente

Maria Silvéria dos Mártires – desafio 202

Passou um dia

Sabes eu não nasci ontem

E tu sabes que foi ontem

Que te amei de alma inteira

Ontem com todo o coração

E muito à minha maneira

Sim foi no dia de ontem

Que colhi da macieira

Aquela maçã viçosa, rosada

Que ontem partilhei contigo

E me chamaste a tua amada

Ontem junto do teu peito.

Agora no meu regaço te dou abrigo

Ontem e sempre conta comigo

Meu querido, meu amigo

Foste e serás meu amor-perfeito.

Maria Silvéria dos Mártires, Lisboa desafio nº 202

Desafio nº 202 ― 7 vezes a palavra ONTEM

Rosélia Bezerra – desafio 221

Há mente fervente a explodir?

Sensação estranha invade?

Dia após dia, há travessia perigosa, não basta olharmos para lados, passarmos por caminhos permitidos.

Por trás do percurso, perigos ocultos, sensação de não leveza, de não soltura,

explosão no subsolo d'alma.

Um belo dia eclode...  implodimos, por não sermos grosseiras nem revidarmos maldades.

Vale autoconhecimento

No Dia Mundial do Coração, estacionar em lugar seguro, atentar perigo iminente,

Não pisarmos em ovos nem em pessoas bombas.

Sejamos caminhos seguros!

Rosélia Bezerra, 65 anos, ES, Brasil

Desafio nº 221 – imagem da passadeira

Publicado aqui: https://espiritual-amizade.blogspot.com/2020/09/cuidar-do-coracao.html 

Desafio nº 221

Proponho-vos esta imagem, para servir de mote para o texto do desafio.

O que vos parece?


A mim, surgiu este:
– Um jantar surpresa? E tu disseste que não?! Sinceramente não há quem te entenda, passas a vida a queixar-te que a tua vida é monótona, que precisas de fazer coisas diferentes e quando finalmente te convidam para um jantar surpresa tu não aceitas?
– Vai tu ao ”jantar em ambiente íntimo e húmido, para o qual deverá trazer roupa impermeável, botas de borracha e capacete. Ponto de encontro no esgoto da passadeira à saída da urgência do hospital.”

Paula Isidoro, 39 anos, Salamanca, Espanha

Desafio nº 221 – imagem da passadeira

29/09/20

Fernanda Malhão – desafio 134

Não era para ser

Chegou demasiado tarde. O entrevistador não esperara por si.

Desmoronou em sentidas lágrimas. Estava tão contente por estar selecionado para a entrevista final, acordou cedo, alimentou-se bem, vestiu sua melhor roupa e partiu rumo à entrevista. Não contava era com a greve dos autocarros, que fosse tão difícil arranjar um táxi, com o terrível trânsito. Decidiu então ir a correr, correu até ficar sem fôlego, mas não chegou a tempo! Será que não estava no seu destino?

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 134 ― «Chegou demasiado tarde…»

Helena Rosinha – desafio 220

Um mundo particular

Como eu gostava que me levasses até esse mundo onde te encerras. Gostava que me levasses, que partilhássemos brincadeiras e aprendizagens, que falássemos e ríssemos. Gostava que me levasses e me deixasses ver o que vês, sentir o que sentes. Preciso conhecer, preciso compreender, aceitar as tuas escolhas. O desenho e a pintura são a tua forma de comunicar – expressão de inteligência, sensibilidade, inocência. 

Como gostava de fazer parte desse universo. 

Leva-me até ele.

Até ti.

Helena Rosinha, 67 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Maria Silvéria dos Mártires – desafio 203

O boneco

Nesta bonita manhã enchi-me de coragem peguei em lápis fiz na tela um desenho, boneco, vistoso quase da minha altura.

O quarto estava, vazio sem móveis nem outros quaisquer ornamentos, ganhou de imediato vida. Sem ponderar muito mudei uma pequena estante que estava na sala, um sofá, pufes, espalhei por todo o lado livros, corri o risco de ficar sem eles, mas as crianças ficaram felizes, pintam, leem, divertem-se, sorriem para o boneco que dizem ser mágico.

Maria Silvéria dos Mártires, Lisboa

Desafio nº 203 – risco + 6 palavras

28/09/20

Fernanda Malhão – desafio 133

A lição

Em crianças passavámos a vida a pregar partidas. Um dia, quando estávamos a cortar a cerca do curral do Sr. Carronha, assim o chamávamos, fomos apanhados em flagrante. O senhor estava tão furioso que era capaz de nos matar. Sr. Carronha pegou na bicicleta, foi atrás de nós em perseguição, mas coitado não estava habituado a andar a alta velocidade, caiu da estrada para um monte de silvas. Ficámos com remorsos e nunca mais fizemos destas partidas.

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 133 ― cair nas silvas

Mariana Miguel – desafio 196

Só se fosse louco, gostaria das manhãs chuvosas e cinzentas de janeiro, dos casacos e sobretudos amontoados sobre o bengaleiro à entrada e dos guarda-chuvas molhados pendurados à porta de casa.

Só se fosse louco, gostaria das noites frias e ventosas ou de apanhar o metro no regresso do trabalho e ser surpreendido pelo pano denso e escuro que, sem aviso, se estendera no céu. 

Mas ainda bem que não sou louco, e que ainda é setembro!

Mariana Miguel

Desafio nº 196 ― só se fosse louco

Elsa Alves – desafio 108

Neste instante em que a mensagem tenta ultrapassar o filtro da máscara, sofre distorções e chega aos ouvidos dos meus alunos, penso sempre na metamorfose que as palavras sofrem e como vão ser recebidas pelos ouvidos atentos, curiosos e não menos criativos deles. Imagino um Esopo a virar copo, uma Afrodite a tornar-se apetite, um Baco a consubstanciar-se em naco, um Plutão a virar pão, um Apolo já a caminho de desconsolo e Zeus a ser adeus. 

Elsa Alves,72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 108 ― 6 palavras que originam outras 6

Paula Isidoro – desafio 220

Gostava que me levasses contigo? Não sei, talvez não gostasse assim tanto. Sempre as mesmas pessoas, sempre as mesmas conversas, sempre a mesma comida e regras de etiqueta que não domino. E as perguntas? Podia escrever um livro com todas elas. Se gostei que me levasses das primeiras vezes? Sim, não vou negar. Mas agora? Agora estou cansada, já não me apetece ir, aliás o que menos me apetece é fingir que gostava que me levasses contigo.

Paula Cristina Pessanha Isidoro, 39 anos, Salamanca

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Elsa Alves – desafio 106

A palestra 

A palestra estava a ser espectacular. A assistência deixava-se empolgar pelas palavras mágicas do professor Smith. No anfiteatro repleto, quem se podia culpar por se sentir arrebatado pelo magnífico discurso, sobre a sua recente descoberta científica? A possibilidade de transformar um réptil repelente numa réplica perfeita de um ser humano? O público não deixava de sentir alguma repulsa por esse tipo de experiências laboratoriais. Um rapazola levantou-se e gritou: "Isso é aldrabice! Você quer é poleiro! Crápula!”

Elsa Alves,72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 107 ― 10 palavras com PLR

Paula Isidoro – desafio 219

Mal abriu a carteira, viu a conta ainda por pagar. Será que isto desconta? Chegarei a tempo? É hora de ponta! Pedir novos favores, será isso uma afronta? Eles vão achar que não estou pronta? O que é que realmente me amedronta? Não quero ser aquela que sempre desaponta. E se eles me dizem novamente “desmonta”? Podiam não o ter tido em conta? Tanta dúvida, tanta pergunta... sinto-me mesmo tonta! O melhor mesmo é fazer de conta.

Paula Cristina Pessanha Isidoro, 39 anos, Salamanca

Desafio nº 219 – terminações eito, onta, ite

Elsa Alves – desafio 106

Na quinta do tio Horácio

A horta estava arruinada! O tio Horácio conhecia os culpados:  os coelhos que comiam cenouras, alfaces, rabanetes... Declarou-lhes guerra. Amedrontados, os coelhos esconderam-se na toca. O sr. Coelho achava que conseguia desmontar as armadilhas espalhadas pela horta. A sra Coelha e os pequenitos, até sentiam as orelhas dormentes. Os alimentos na toca estavam todos fermentados. Que fome! As armadilhas, ornamentadas com legumes frescos, eram tentadoras. Tinham que resistir ou ficavam tramados... Transformados no jantar do tio Horácio...

Elsa Alves,72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 106 – palavras com D R O

26/09/20

Fernanda Malhão – desafio 132

Abro pela última vez a janela de dava para o adro. Saio por ali fora com a cabeça a andar à roda. Paro, vejo as andorinhas a voar, o rio raso pela falta de chuva. Tantos anos a trabalhar nesta roça, conheço cada ramo, cada tora como as palmas das minhas mãos. Mas chegara a hora de partir, a minha afro-descendência e sua tradição oral chama por mim. Espero não pagar caro esta decisão. Orai por mim!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 132 ― AOR + 1

Fernanda Malhão – desafio 131

Um casal improvável

Hermengarda Pirraça era cantora de ópera, detentora de uma voz tão arrebatadora como o mau feitio que a caracterizava. Tinha uma face bruta, carrancuda e de acordo com o boato que corre nunca sorriu na vida. Quando abria a boca era unicamente para comer, rezingar ou cantar (era perita a fazer as três). Um dia o coração de pedra da cantora caiu na rede do amor. Quem diria que um cantor pimba iria mudar permanentemente seu futuro.

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 131 ― Hermengarda Pirraça sem S e L

Fernanda Malhão – desafio 130

Trigo

Um enorme grupo de nutricionistas crucificam o que foi por séculos considerado a espiga dourada, o pilar da alimentação: o trigo. O brilho deste cereal esbateu-se com o tempo, já não tem o mesmo valor, é mesmo considerado um vilão. O pão foi alimento que garantiu o sustento de muitos povos. Hoje, as recomendações são que devemos evitar ou eliminar o trigo pelo glúten que contém. Nos países mais pobres a espiga dourada continua a ser esperança!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 130 ― de espiga a esperança

Elsa Alves – desafio 105

Razões do coração

Sabia-se teimosa. Aceitava este seu traço, embora preferisse adoçá-lo, dizendo-se" persistente". Diziam-lhe as amigas: " Tu és parva!!!". Teriam razão neste apontar-lhe alguma insanidade? Demonstravam-na culpada." Continuas a fazer o mesmo, todos os dias... A desculpá-lo. Esperas que ele mude e passe a tratar-te bem? Até hoje, ele tem-te maltratado. Enganado. Mentido. " Reconhecia-lhes razão, quando pensava mais friamente. Como podia esperar um resultado diferente, se continuava sempre a agir da mesma forma? Mas... o coração toldava-lhe a razão...

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 105 – frase de Einstein

25/09/20

Fernanda Malhão – desafio 129

A descoberta

Ana já desconfiava que o marido tinha uma amante. Mas alimentava uma esperança que fosse só a sua imaginação. Mas começaram a surgir tantas situações, que cada vez mais acentuavam as suas dúvidas. Já não aguentava mais aquela situação. Um dia finge estar adoentada para não ir trabalhar e poder fazer de detetive seguindo o marido. E bingo! Viu o marido entrar no carro de uma loiraça, anota a matrícula e agora vai recorrer a serviços profissionais.

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar 

Desafio nº 129 – palavras que vêm de NATA

Carla Silva – desafio 203

A Pintura

Podia ser a pintura mais bonita da galeria. A pièce de resistence segundo os entendidos na matéria. 

Mas para ela estava muito longe de ser tudo isso. Ela nem percebia o que representava!

Se bem que ela nunca percebeu de arte. Olhou novamente para a pintura... 

Não adiantava. Ela apenas via um borrão preto numa tela branca. 

As caricaturas, feitas a lápis, do vizinho eram bem mais perceptíveis. Até o risco no seu carro fazia mais sentido.

Carla Silva, 46 anos, Barbacena, Elvas

Desafio nº 203 – risco + 6 palavras

Elsa Alves – desafio 104

Dilema

Antecipava tudo em múltiplos pormenores: os sentimentos, as tentações e, mesmo, procedimentos. Ora... sozinha alcançaria tudo? Embaraçada, muito pensava Ofélia, sentindo-se aflita. Tonta! Esperava milagres? Pateta! Odiava sentir aqueles terríveis enigmas. Magoada, preferiria obter soluções adequadas. Tamanha espera... Maligna. Pensou: "O suplício atenuar-se-á? Talvez encontre mais pessoas odiando sofrer." Atraía-a tal expectativa? Mentira. Preferiria ouvir saudações amáveis. Talvez elogios. Multidões prestáveis. Ombros solidários. Atreveu-se, temerária, em manter posição. Ousou suster as terríveis emoções. Manifestava pânico ou sabedoria?!?

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 104 – letras obrigatórias: A T E M P O S

23/09/20

Fernanda Malhão – desafio 220

Gostava que…

Gostava que me levasses à sério, pelo menos uma vez. O que te conto são os mais sinceros sentimentos, não sei porque não acreditas em mim. Gostava que me levasses contigo no teu regresso, não suporto mais estar longe de ti tanto tempo. Se isso não for possível, gostava que me levasses pelo menos dentro do teu coração e que pensasses seriamente na possibilidade de me dares uma oportunidade para fazer-te feliz. Faço qual coisa por ti!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Fernanda Malhão – desafio 128

A libertação

Sentia um alívio na garganta. Viveu anos em profunda asfixia, com sentimentos guardados na gaveta do seu coração. O azedume das palavras, aquela aparente idiotice, era na verdade dor arquivada. Tudo isso está agora finalizado!  Conseguiu ir buscar a réstia de amor próprio. O rio transbordou, não quis mais ficar contido na margem. O sol voltou à sua vida! Pasmado o outro ficou a olhar, não imaginava que aquele homem submisso teria coragem de tal corajosa atitude!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 128 – 12 palavras com 

Elsa Alves – desafio 102

– Não tem tido cuidado com a sua prótese. Veja esta protuberância...

O ortopedista olhava-o, com ar reprovador. Respondeu-lhe, envergonhado.

– Tenho abusado um bocadinho com o neto ao meu cargo.

– Assinou algum protocolo com a sua filha? Tem de obedecer-lhe cegamente? Proteja a sua saúde. Nada de esforços desnecessários. Vamos reforçar as proteínas na sua alimentação com este suplemento. 

Odiava sentir-se protagonista naquela cena. Não podia protestar, mas, como resistir a andar com o bebé às cavalitas?!?

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 102 – muitas palavras com PROT

Theo De Bakkere – desafio 220

A Sara

Ó memória! Gostava que me levasses à terra onde vive minha Sara tão longe do meu coração.

Ali, numa tarde quente de verão, ali na sombra do carvalho, encontrámos o amor.

Ora, gostava que me levasses para ela, antes que essa recordação doce me escape.

De repente uma voz respondeu: estou aqui, eu também gostava que me levasses ao tempo feliz de antes.

Os olhos abriam-se, e ele olhava para a cara preocupada da Sara, sua esposa.

Theo De Bakkere, 69 anos, Antuérpia, Bélgica

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

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Rosário P. Ribeiro – sem desafio

Estranhou o escuro.  Gostava tanto de luz…

Estremeceu, sentindo-se arrefecer sem sol,

E na janela, já só adivinhou o céu…

Estranhou o silêncio. Gostava de adivinhar o voo das gaivotas e

Do arrepio trazido pela estridência dos seus gritos. 

Apercebeu-se então que não via nem ouvia, num frenesim quieto demais.

Sentia a vida mais longe, a despedir-se,

E os passos estrondosos da morte a chegar.

Não me chorem, pensou, sorrindo.  

Recordem-me. Feliz.

Rosário P. Ribeiro, 63 anos, Lisboa

Elsa Alves – desafio 103

Aparências

Nada mais havia a fazer... Durante anos, a situação tinha--se mantido estável. Estável?!? Só aparentemente... Os outros julgavam que, lá em casa, eram só rosas. Ela sabia bem dos espinhos. Pensava, hoje, que, se ambos tivessem evitado certos silêncios, se tivessem promovido o diálogo, se, em palavras trocadas com sinceridade, tivessem exposto os seus sentimentos...

Se, se, se... Mas, afinal, fora sempre isso que os dois tinham evitado fazer. Agora era tarde. Já só restava a indiferença.

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 103 – 3 frases impostas por ordem

Cristiana Rodrigues – desafio 220

Acordou tarde. Não lhe apetecia o frio que espreitava pela porta entreaberta. Lá fora, sem reconhecer a que distância, ouviu: “Gostava que me levasses.”
A curiosidade destapou-a e fê-la abraçar o escuro… “Gostava que me levasses”, ouviu-se novamente e a luminosidade despertou-a.
Sara sorriu ao livro debaixo do telemóvel: “Gostava que me levasses” percebia-se agora na voz do marido que substituía o toque do despertador.
Ele sabia mimá-la, pena ser desatento. Sara leu aquele livro há semanas.

Cristiana Rodrigues, 38 anos, Lisboa 

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

22/09/20

Fernanda Malhão – desafio 127

O mistério caçador de pérolas

Era mestre em encontrar ostras com magníficas pérolas no seu anterior. Não as mostra a ninguém! Tinha uma sala de aceso restrito, onde passava tempos infinitos a dar lustre às suas pérolas. Só fazia demonstração das pérolas à clientes muito selecionados. Um dia, algo sinistro aconteceu, ouviu-se um grande estrondo, o chão estremeceu, um cheio nauseabundo alastrou pela casa. Senti o suco gástrico subir à boca antes de desmaiar. Fomos todos transferidos para o hospital do distrito!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 127 – stra, stre, stri e stro x 3

Elsa Alves – desafio 101

– Tatá, pressinto que a menina vai adorar aquele restaurantezinho...

– O que fica junto à ponte?

– Exacto. Não resisto... digo-lhe que a especialidade da casa é...

– Robalo?!?

– Adivinhou, queriducha... Com o seu acompanhamento preferido...

– Puré de batata?!?

– Exacto. Vá, docinho, troque essa bata cheia de pó por uma roupinha toda sexy...  Vamos? 

– Robalo com puré de batata... E um copo de vinho tinto...

– Tatá, tenha tino!!! Com o peixe, vinho branco!!!

A Tatá não percebia nada de vinhos...

Elsa Alves,7 2 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 101 ― partindo das palavras BATATA e PRESSINTO

Vanda Figueira – desafio 220

Gostava que me levasses aonde fores. Não precisas de me levar atrás de ti para todo o lado. Não quero ser esse tipo de mãe galinha. Só gostava que me levasses no coração e que quando te encontrares em horas de aperto ou de reflexão e queiras um conselho amigo, uma palavra de consolo ou opinião me encontres lá dentro do teu coração. Meu filho,gostava que me levasses contigo no teu coração e nas tuas asas.

Vanda Figueira, 46 anos, São João da Talha

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Mónica Santos – desafio 220

Bom dia! Abriram-se as portas e estás cá de novo.
Esse olhar melancólico, hesitante. Porque negas a tua vontade?
Gostava que me levasses.
Sei que me imaginas ao teu lado quando escurece. Faço o teu género, encaixo no teu estilo. Gostava que me levasses. Passeias-te pelos corredores, ofegante, enfias as mãos nos bolsos e sais para almoço. Regressas. Devoras-me com os olhos mas não avanças. Porquê? Gostava que me levasses. É hoje! “Candeeiro em promoção só €70.”

Mónica Santos, 43 anos, Matosinhos

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Ana – desafio 220

O teu mundo

Gostava que me levasses contigo, para aquele lugar onde os sorrisos e as lágrimas são verdadeiros. 

Gostava que me levasses contigo, para aquele lugar onde o sonho nos comanda, a alegria, o amor e a confiança imperam. Onde não há pessoas zangadas e tudo se resolve com um beijo. 

Gostava que me levasses contigo, nem que fosse por um só dia, para onde existem as fadas dos dentes e das chupetas, o Pai Natal e os duendes.

Ana, 41 anos, Mealhada 

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Natalina Marques – desafio 220

Gostava que me levasses 

novamente ao nosso lugar

ver as estrelas no céu,

apanhar conchas à beira mar.

 

Lembro tanto, aquela tarde

em que subimos ao monte

e um beijo me roubaste

ao beber água na fonte.

 

Gostava que me levasses 

de novo àquele jardim,

de mãos dadas passear

e ter-te junto de mim.

 

Gostava que me levasses 

e dançasses para mim.

Ouço teus passos chegar,

o meu sonho, chega ao fim,

mas, GOSTAVA QUE ME LEVASSES.

Natalina Marques, 61 anos, Palmela

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

21/09/20

Fernanda Malhão – desafio 126

Criança intermitente

Tinha apenas 7 anos e vivia em guarda partilhada. Não se importava em viver uma semana em cada casa, o que o incomodava era ter de lidar com as desavenças dos pais. Quando estava com a mãe ouvia queixas acerca das más influências do pai, e que se refletiam no seu comportamento. Quando estava com o pai, ele estava sempre a contrariar aquilo que a mãe o mandara fazer. Sentia-se intermitente com aquelas mudanças de comportamento repentinas!

Fernanda Malhão, 44 anos, Gondomar

Desafio nº 126 – sentia-se intermitente

Toninho – desafio 220

Vejo campos de girassóis, onde vibrei, com teus olhos brilhantes. Gostavas que me levasses a reviver a primavera pelas terras lusitanas inesquecíveis momentos poéticos.

Ainda vejo campos floridos, pássaros em cantoria pelo amanhecer. Gostavas que me levasses a ver o dourar da tarde junto ao Tejo, ouvindo o vento como um fado, olhos amarelados encantados à procura dos teus

Gostavas que me levasses no último olhar às serras e de mãos dadas trocaríamos o céu. É isso.

Toninho, 64 anos, Salvador-Bahia-Brasil

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Publicado aqui: Desafio 77 palavras_mineirinho


Elsa Alves – desafio 100

Acasos

Conheceram-se por um acaso, daqueles que julgamos que só acontecem nos livros e, afinal, não é nada assim. Acontecem no dia-a-dia e com frequência. Tinham ido os dois à biblioteca, requisitar o mesmo livro: 

“Inversos", a poesia completa da Ana Luísa Amaral. Os dois rendidos à mesma poeta. Trocaram opiniões sobre poesia. Concordaram. Discordaram. Riram. Nenhum levou o livro. Continuaram a encontrar-se. Na biblioteca, e fora dela, no café, no cinema. E foi assim que se escreveram...

Elsa Alves, 72 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 100 – «e foi por isso que me escrevi»

Maria João Cortês – desafio 216

Vila Facaia era uma aldeia simples, mas muito acolhedora.

Aida, apesar de citadina gostava de lá estar, pois nascera numa pequena casa caiada de branco que pertencera à família, que fazia a sua vaidade

Mal abria a janela o cheiro acre da humidade da noite, entrava pela casa dentro e o chilrear acompanhado do bailado dos pássaros, punha-a na maior das felicidades.

Aquele pão com sabor a fermento era coisa inesquecível.

Enfim, era feliz em Vila Facaia.

Maria João Cortês, 77 anos, Lisboa

Desafio nº 206 – 7 plvras com ditongo «ai»

Verena Niederberger – desafio 220

Gostava que me levasses, novamente, para passear no seu fusquinha azul.

Tantos momentos felizes passamos quando viajávamos, juntinhos, para junto do mar.

Praias calmas perfeitas para relaxar.

Gostava que me levasses para degustar deliciosa pizza ao som "daquela" música de Chico Buarque que tanto nos marcou.

Gostava que me levasses para o baile de carnaval, no clube, onde nos divertíamos até o dia clarear.

Gostava que me levasses para aquele mundo de sonhos que, infelizmente, distante ficou.

Verena Niederberger, 69 anos, Rio de Janeiro - Brasil

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Publicado aqui:  https://interagindocomosbichinhos.blogspot.com/2020/09/historias-em-77-palavras.html


Violeta Seixas – desafio 219

Desfeito

Descontente, decido, afinal, que desfaço o leito. Ele, sentimental, de rastos e coração desfeito; eu a achar que estava demasiado perfeito. Determinada, às cegas, corto tudo a eito. Já está! Mas suspeito que sem proveito. Nesta nova visita, risco, arrisco, procuro-me, enfeito mil alternativas. Aqui o ar é rarefeito: que tontura! Não importa se há defeito. Sem receio e com todo o respeito pelas palavras escritas acima, rejeito o conceito: cabia-me refazer e encontrar o (texto) eleito.

Violeta Seixas, 54 anos, Algés

Desafio nº 219 – terminações eito, onta, ite

Violeta Seixas – desafio 219

Aceito

Que dificuldade tenho em chegar ao parapeito! Agora, estendo-me, estico-me para alcançar o sujeito. Achava eu que seria dito e feito, bastaria para isso assobiar, assobiar a preceito, sem pensar que é necessário o jeito. Podia ter imaginado alguém com certo trejeito. Desenhar-lhe uma vida de dores no peito, sem maisArrasto-me, penso que sem defeito, por essa página solta onde me deito. Onde julgava ser o meu leito perfeito. Mas é apenas isto, quando me espreito…

Violeta Seixas, 54 anos, Algés

Desafio nº 219 – terminações

20/09/20

Lica – desafio 221

Lembro-me perfeitamente de aparecer as passadeiras para os peões. Era obrigatório atravessar por elas, senão, era uma multa de 2 §50. Havia poucas, mas bem localizadas, o que não acontece agora.

A fotografia para este texto, é como devia ser em toda a parte – sinais para os carros saberem que há uma passadeira para peões.

Há peões que são “abusados”. Atiram-se para a passadeira sem olhar, porque acham que é seu direito atravessar, e se correr mal, receberão indeminização.

Lica, 81 anos, Lisboa

Desafio nº 221 – imagem da passadeira

Glória Vilbro – desafio 220

Gostava que me levasses pela mão... 
Tenho fome do mar ao fundo das ruas. 
Sede do sol de então, das conversas à toa. 
Lembro os policias e ladrões, detectives e espiões... 
Mulheres perdidas, fantasmas adivinhados. 

Gostava que me levasses ao Jardim mais bonito da cidade... 

E me ensinasses ciências, e as palavras francesas que sabias. 
Abrisses o pacote das batatas fritas... 

Gostava que me levasses contigo outra vez... 
Me deixasses chorar...
Eu sem medo de ser mariquinhas. 

Glória Vilbro, 53 anos, Negrais, Almargem do Bispo, Sintra

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Chica – desafio 220

Gostava que me levasses novamente para aquele lugarzinho tão lindo onde tanta coisa boa vivemos. 

Lembras dele? 

Gostava que me levasses para tudo aquilo, novamente pudéssemos desfrutar, mas com todo aquele cenário igualzinho, irretocável e maravilhoso naquela pequena praia quase só nossa.

Risadas, chorinhos, reclamações, broncas por vezes necessárias, mas a alegria e grande amor sempre. 

Gostava que me levasses lá, mas envelhecemos, eles cresceram, até o hotelzinho fechou... 

Só nossa recordação pode nos levar até lá!

Chica, 70 anos Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil 

Publicado aqui: https://chicabrincadepoesia.blogspot.com/2020/09/saudades.html

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Rosélia Bezerra – desafio 220

Pelos jardins da vida, gostava que me levasses como se fosse uma delicada flor do campo.

A cada manhã, me levantas com suavidade de beija-flor, vindo ao meu encontro, com asas de amor que me despertam do nosso ninho que me preparas a cada anoitecer.

Entretanto, gostava que me levasses por todas as horas, sem nenhuma interrupção indispensável a ti.

Por toda eternidade, gostava que me levasses, enfim, meu amor!

Certamente te faria alçar voos altaneiros, alegres.

Rosélia Bezerra, 65 anos, ES, Brasil

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

Publicada aqui: https://espiritual-amizade.blogspot.com/2020/09/alcar-voos-altaneiros.html

Maria João Cortês – desafio 202

ONTEM, o sol brilhou a todas as horas.

ONTEM, era uma menina despreocupada, que não pensava que

ONTEM haverá um dia de amanhã.

Um dia que não será igual ao de ONTEM.

Um dia que poderá haver chuvas e trovoadas.

Que os dias de ONTEM teriam misérias e desgraças,

E que ela nada poderia fazer para o evitar.

ONTEM fora um dia maravilhoso que não vai voltar mais.

Já houve ONTEM, hoje e espera-se que um amanhã.

Maria João Cortês, 77 anos, Lisboa

Desafio nº 202 ― 7 vezes a palavra ONTEM

Desafio nº 220

Neste nosso desafio, existe uma regra: repetir 

Gostava que me levasses

Pelo menos 3 vezes.

A frase pode ser adaptada.

 

Experimentei e saiu assim:

Gostava que me levasses lá…

Ao lugar onde as estrelas cintilam nos olhos felizes,

Os gritos são de recreio

e os dias correm para a noite como a água para o mar.

Gostava que me levasses lá,

Ao sonho que gastei de tanto o usar,

Sem medo de sorrir ou chorar.

E conversar, de mansinho, entrelaçando os meus nos teus dedos.

Por fim, encostar-me no teu abraço.

Gostava tanto que me levasses…

Mas parti sem lá chegar.

Rosário P. Ribeiro, 63 anos, Lisboa

Desafio nº 220 – gostava que me levasses

19/09/20

Helena Rosinha – desafio 218

Chamas

Na lenha que arde, na dança das chamas, acendem-se as lembranças. 

Serões familiares, os adultos à conversa e nós, sorrateiramente, a sair pela porta da cozinha, a saltar a cancela do quintal.  Imersos no cheiro da noite, enfrentávamos sombras gigantes, sons estranhos, tentávamos dissimular o medo. Na busca de aventuras e mistérios insolúveis, descobríamo-nos mutuamente, surpreendíamos, éramos surpreendidos. 

Ateada a chama da liberdade, extinguiam-se impossíveis; desafiavam-se costumes, acumulavam-se certezas — o nosso, seria um mundo perfeito. 

Algo falhou. 

Helena Rosinha, 67 anos, Vila Franca de Xira

Desafio nº 218 – imagem de fósforos